Resolubilidade Maquínica, Sistemas de Gestão e Nível de Automatização das Organizações

*Por Carlos José Pereira, sócio-fundador e atual Diretor-Presidente da Fácil Informática

Pedro Domingos afirma que se voltássemos no tempo, no início do século XX, e disséssemos às pessoas que uma máquina seria inventada em breve e que resolveria problemas de todas as áreas do conhecimento, a mesma máquina para todos os problemas, ninguém acreditaria. Elas diriam que cada máquina só pode fazer uma única coisa: máquinas de costura não datilografam e máquinas de escrever não costuram. [1]

Para este artigo o computador é observado como a unidade da diferença entre hardware e software e enfatiza-se principalmente o software, aqui representado pelos sistemas de gestão.

Pode-se atribuir o sucesso dessa máquina incomum chamada computador principalmente ao software, pois ele é que dá a flexibilidade necessária, embora se tenha claro que, sem um hardware capaz de suportá-lo, não haveria software.

Selecionar o software adequado para resolver um problema complexo transforma-se em uma empreitada também complexa, que vem evoluindo ao longo do tempo, envolvendo diversas dimensões. Focaremos aqui na parte tecnológica de construção dos sistemas de gestão, muitas vezes negligenciada e que pode ser a razão de insucessos e frustrações na utilização dos sistemas adquiridos.

Resolubilidade Maquínica

Resolubilidade Maquínica é um termo criado pelo autor, portanto, não é uma terminologia comum e o seu significado está associado à capacidade de resolver ou solucionar problemas por meio de máquinas.

Este artigo aborda a automatização das organizações por meio de um sistema de gestão. O nível de automatização pode ser baixo, médio ou alto e está ligado à qualidade do sistema de gestão selecionado, envolvendo diversas dimensões. O foco aqui é no aspecto das tecnologias utilizadas na construção do sistema e a importância delas para um nível alto de automatização, aspecto esse ainda “esquecido” ou não tratado adequadamente nos processos de seleção de um sistema de gestão.

Máquinas

O termo máquina é utilizado no sentido cibernético. Na cibernética, o termo máquina não se refere apenas a dispositivos físicos como computadores ou robôs, mas é usado de forma mais abrangente para descrever sistemas que processam informações e realizam operações. A definição de máquina, na cibernética, inclui qualquer sistema que tenha entrada, processamento e saída de informações. [2] Portanto, fórmulas matemáticas, cálculos e regras de transformação, também são máquinas. Assim um sistema de gestão, um programa de computador, é uma máquina.

 Automatização

Automatização é o processo de substituir o trabalho humano por máquinas. A automatização pode ser usada em uma ampla gama de atividades, desde tarefas simples e repetitivas até tarefas complexas, com pretensões de chegar à tomada de decisões. Têm-se, até o advento da inteligência artificial, que máquinas são artefatos “altamente confiáveis e prognosticáveis”, porém com o surgimento dos novos modelos generativos, fala-se até em “alucinações” dos algoritmos de IA.[3]

Nível de Automatização da Organização e Grau de Automatização de uma Tarefa

Para as organizações utiliza-se os termos nível baixo, médio e alto, para indicar uma posição ou extensão de caráter mais geral, em relação à automatização, considerando-se o conjunto de todas as tarefas envolvidas em todas as áreas de uma empresa. Está-se diante da impossibilidade de determinação precisa do alcance da automatização em uma organização. Os executivos procuram um alto nível de automatização para suas organizações, significando que desejam o máximo possível de automatização que se possa obter com as tecnologias atuais.

Porém, para tarefas específicas utiliza-se o termo grau de automatização. Pode-se afirmar, por exemplo, que a tarefa foi 100% automatizada, 10% automatizada ou 80% automatizada. Os responsáveis pelas tarefas ou aqueles responsáveis pela automatização delas podem indicar graus de automatização, que ainda que imprecisos podem ser de grande valia para as análises dos gestores.

Sistema de Gestão - Planejamento de Recursos Empresariais

Enterprise Resource Planning (ERP) [Planejamento de Recursos Empresariais] é um sistema de informação que auxilia na gestão empresarial, automatizando todas ou muitas das tarefas de uma organização. Assim, um sistema de gestão empresarial deve ter pretensões de universalidade, para abranger o máximo possível de atividades no âmbito a que se destina.

Especialização dos Sistemas de Gestão

Dadas as diferenças existentes entre negócios que operam em áreas diferenciadas, há no mercado sistemas de gestão especializados que são mais adaptados às regras de negócio e às peculiaridades da área em que opera a organização. Um escritório de advocacia vai encontrar num sistema de gestão jurídica, e não num sistema de gestão industrial, soluções mais próximas para os seus problemas.

Sistemas de gestão, desenvolvidos para áreas específicas, necessitam de menos personalizações para automatizar as diversas atividades de uma organização, significando menos custos e prazo menor para implementação.

Dificilmente uma organização consegue chegar a um nível alto de automatização sem personalizações no sistema de gestão escolhido, porém, três pontos importantes devem ser fortemente considerados: a) o sistema exige muitas personalizações? b) Como são realizadas essas personalizações? c) Como o fornecedor às mantém durante a vida útil do sistema, considerando-se as inevitáveis trocas, devido às versões futuras?

Desta forma, pensando-se em uma organização operando no seu dia a dia, todos esses fatores combinados exigem que o desenvolvimento de um sistema de gestão seja bastante pragmático e repleto de passos e regras.

A Evolução da Técnica e a Importância Para a Resolubilidade Maquínica

Analogias não Substituem Equivalências - Cuidado ao Avaliar Sistemas de Informação

Deve-se ter presente o que Fiolhais afirma sobre analogias: “[…] as analogias não substituem equivalências […]”, “[…] são tão úteis como enganadoras […]” e “A identidade das designações leva muitas vezes erradamente a supor identificação dos conteúdos.” [4] De acordo com Pinker, metáforas são generalizações, que incluem um caso específico numa categoria universal e que “[…] assim como outras generalizações, as metáforas podem ter suas previsões testadas e seus méritos inspecionados, incluindo sua fidelidade a estrutura do mundo.” [5]

Há de se ter cuidado quando, nas avaliações de sistemas de gestão, são utilizadas analogias, comparando a compra de um sistema de informação à de outros produtos. Como demonstrado neste artigo, a complexidade do processo de escolha de um sistema de gestão é enorme e diferenciada, pois está ligada diretamente ao modelo de negócio da organização e a solução de problemas por meio dele.

A Evolução das Máquinas - Softwares e Hardwares - Computador, que máquina é essa afinal?

A máquina analítica, projetada pelo matemático e inventor britânico Charles Babbage, no século XIX, é considerada a precursora dos computadores atuais, pois já previa uma unidade de processamento, uma unidade de memória e uma unidade de entrada e saída. O objetivo da máquina analítica era executar cálculos complexos e manipular símbolos. Ada Lovelace, que colaborava com Charles Babbage, foi a primeira a perceber seu potencial para além de simples cálculos matemáticos. Ela escreveu notas detalhadas sobre o funcionamento da máquina, incluindo um algoritmo para calcular os números de Bernoulli, tornando-se assim a primeira programadora da história. [6]

Iniciava-se uma separação importante entre a parte física de uma máquina em si (hardware) e a possibilidade de programá-la para cálculos matemáticos diferenciados (software). Nascia um novo conceito de aparato com base numa codependência entre o hardware e o software; nascia o computador. A parte física da máquina (hardware) só fazia sentido se pudesse alternar seu funcionamento a partir de algoritmos diversos (software), criados para aproveitamento dessa estrutura básica, em princípio ilimitados, porém o software só fazia sentido se tivesse uma máquina que segue suas instruções, que pudesse dar vida a ele.

Atualmente, para os indivíduos, fica mais clara a separação entre a parte física da máquina e os aplicativos que nela se instalam, bem como a interdependência entre hardware e software.

O computador não é somente hardware ou somente software. Ele não é uma coisa e nem outra. É algo diferente, emergente. Quando um programa está sendo executado, há um acoplamento estrutural entre as duas estruturas, uma interpenetração entre elas. [7] Na história se percebe uma coevolução destas estruturas. Quanto mais potente for o hardware, mais softwares complexos podem ser desenvolvidos e softwares complexos exigem o desenvolvimento de hardwares mais potentes em termos de velocidade e capacidade de armazenamento. Atualmente têm-se um bom exemplo com a difusão da Inteligência Artificial Generativa (baseada em deep learning), que demanda muito poder de computação. Assim, embora haja um progresso separado dessas estruturas, quando se analisa o computador em si, como unidade da diferença entre hardware e software, vê-se um processo autorreferencial, em que o computador progride sem a estipulação de um limite pré-determinado, embora nem hardware e nem software, separadamente, pressuponham isso. De acordo com Luhmann, a autorreferência não só define, como também contém uma afirmação sobre coisas, pois sustenta que a unidade somente se alcança a partir de uma operação relacional. [8]

O que torna o computador tão especial é justamente a unidade dessa diferença, em outras palavras, uma junção de coisas tão diferentes. Um mesmo hardware pode dar vida a muitos algoritmos, transformando o computador em um artefato muito interessante, pois transmuta-se em algo que não era, com utilidades diferentes para os seres humanos, pois sua identidade não precisa ser preservada.

Um jovem vê um computador como divertimento, um administrador como uma ferramenta de gestão, um programador como uma forma de auferir renda (alguns como forma de divertimento) e um matemático como uma grande, potente e rápida calculadora.

Os programas e sistemas com códigos explícitos, não baseados em IA, que são máquinas, pois se aplicadas as mesmas regras de transformação sobre as entradas, têm-se as mesmas saídas, utilizam-se da complexidade do hardware para ganhar vida, porém o hardware também se aproveita da complexidade do software para existir e assim não se pode afirmar que os programas sejam mais importantes que a parte física ou vice-versa.

Acoplamento Estrito - O Preço Elevado da Confiabilidade

Os programadores instruem os computadores, para realizar as tarefas, por meio do software, a partir de uma linguagem computacional composta de um conjunto de palavras. [9] Os programas (algoritmos) compõem-se de muitas dessas palavras ligadas umas às outras, no que se poderia denominar de um acoplamento estrito entre elas.

Acoplamento estrito entre palavras significa que quaisquer dessas palavras adquirem significado nessa relação a que foram expostas. Quando se fala em linguagem computacional, não há interpretação e o sentido é dado pelo programador, com vantagens e desvantagens que citaremos apenas superficialmente neste artigo.

Com os programas tradicionais, códigos explícitos, não baseados em IA, confia-se exageradamente nas máquinas, pois, se fez milhões de vezes daquela maneira, continuará fazendo outras milhões de vezes da mesma forma; máquinas são confiáveis; computadores são confiáveis. Porém, essa confiabilidade tem um preço bastante elevado.

A confiabilidade, que resulta no computador seguir os comandos dos programadores à risca e fazer tudo da mesma forma, sem se cansar, sem interpretar, sem atribuir sentido, é também uma das maiores restrições dos algoritmos tradicionais (fora do âmbito da IA), pois, quaisquer alterações dependem de programadores, gerando custos e dificuldades inerentes à tarefa de alterar códigos complexos.

Como, então, ganhar produtividade para atender a uma demanda crescente por profissionais técnicos, bem como, por novos aplicativos e personalizações nos programas utilizados por organizações dos diversos setores da economia?

As Diversas Técnicas a Serviço da Resolubilidade Maquínica

Gestores estão diante de um grande desafio quando precisam escolher um sistema de gestão para suas organizações. Os processos de seleção têm progredido, envolvendo diversas dimensões, mas ainda assim, há um aspecto que tem sido relegado a um segundo plano, e que, entende-se, deverá se tornar um dos principais a serem considerados em quaisquer processos de seleção.

 A dimensão tecnológica, entendendo-se como o conjunto de técnicas empregadas que estruturam um sistema de gestão, deverá ser fortemente considerada nos processos de avaliação. É a partir desse conjunto de técnicas que um sistema de gestão adquire a flexibilidade necessária para resolver os problemas do dia a dia das organizações, atendendo às suas peculiaridades e estruturas diferenciadas.

Entende-se que um sistema de gestão deve ser o resultado de uma simbiose entre as diversas técnicas apresentadas anteriormente, tanto aquelas ligadas à construção de suas estruturas, quanto aquelas ligadas ao desenvolvimento e aos diversos processos de personalização, sem as quais há sérias limitações para que as organizações atinjam um alto nível de automatização.

Gestores em Busca de um Alto Nível de Automatização

Existem várias razões para as automatizações das atividades em organizações, mas ao final, o que importa, é se a operação delas não foi afetada negativamente e se a empresa obteve aquilo que desejava.

Gestores já não aceitam mais a “dureza” estrutural presente em alguns sistemas de gestão que exigem que somente a organização deva se adaptar às suas estruturas, mas insistem que o sistema deve ser flexível o suficiente para se adaptar àquelas estruturas que são diferenciais da organização.

A Árdua Tarefa de Seleção de um Sistema de Gestão - Uma Nova Dimensão Precisa ser Fortemente Considerada

O processo de escolha de um sistema de gestão, para uma determinada organização, vêm progredindo ao longo do tempo, compondo-se de fases como: solicitação de proposta (Request for Proposal - RFP), em que são estipulados requisitos a partir das necessidades da organização, avaliação dos fornecedores e planejamento da implementação. Ainda assim, diversas organizações têm errado em suas escolhas, com todas as consequências daí advindas.

Neste artigo não se deseja estressar e apresentar os principais problemas existentes nessas fases e que também contribuem para as dificuldades de escolha de um produto. Afirma-se que muitas empresas não têm dado importância à tecnologia aplicada aos sistemas de gestão, seja por não abordarem essa dimensão em seus documentos de seleção, seja por não detalharem adequadamente as características apontadas neste artigo e descobrem as restrições, ligadas à falta de técnicas importantes, somente durante a utilização deles.

A Dimensão Tecnológica nos Sistemas de Gestão - Resolubilidade Maquínica

Gráfico 1 - Complexidade do problema, adaptabilidade do sistema e Resolubilidade Maquínica x custo x tempo

O gráfico 1 apresenta três divisões, representadas por cores diferentes. Cada uma dessas divisões reúne um grupo de técnicas que formam a tecnologia empregada em um sistema de gestão, visando o estabelecimento de uma solução que se ligue com o problema de automatização de uma organização específica.

No caso de um sistema de gestão, dada a complexidade do problema, a solução deve necessariamente passar pela utilização desses grupos de técnicas, que juntas formam a tecnologia empregada. Sistemas de gestão, tecnologicamente atualizados, precisam necessariamente oferecer essa complexa reunião de técnicas, nesse sentido é que os processos de avaliação de sistema devem contemplar uma nova dimensão que estresse a tecnologia empregada. Em outras palavras, não basta uma visão superficial do sistema em termos de tecnologia, essa dimensão deve receber o mesmo cuidado que é dado às demais dimensões, pois sem ela, as demais ficam prejudicadas.

Parametrização

O primeiro conjunto de técnicas diz respeito aos diversos parâmetros, que combinados, permitem ao sistema resolver problemas importantes, porém comuns, pois em geral são problemas que estão presentes na grande maioria das organizações. É uma solução bastante simples e eficiente, encontrada pelas empresas fornecedoras de sistemas, para o que se propõe, que é a solução de problemas empresariais ligados à diferenciação das organizações, porém identificados a priori.

A quantidade de parâmetros tende a aumentar à medida que as empresas fornecedoras vão ganhando mais e mais clientes. É uma técnica simples, de fácil implementação pelas empresas fornecedoras e de fácil utilização pelos clientes.

Porém, deve-se considerar que esses parâmetros se relacionam entre eles, criando milhares de combinações e exigindo cuidado e responsabilidade na utilização deles e muita eficiência no suporte aos usuários.

Parâmetros podem ser simples –  como por exemplo botões de liga e desliga –, mas podem apresentar maior complexidade com listas de elementos fixos e finitos, especificados pelos programadores, bem como permitir elementos infinitos, inseridos pelos próprios usuários do sistema.

Essa camada de técnicas é fundamental, simples e elegante, mas para um sistema de gestão ela é insuficiente. Essa solução se presta para um nível de complexidade baixo, pois a adaptabilidade do sistema é reduzida, embora sem ela tudo seria muito mais difícil.

Personalize Você Mesmo - Tecnologia e-PVM

Quando a camada de parametrização é insuficiente, deve-se recorrer à camada no code.

Deve-se entender essa camada como a possibilidade de personalização de um sistema sem a utilização de programadores que dominam a estrutura e a linguagem básica em que o sistema foi escrito.

Porém, a partir de uma interface visual e interativa muito simples e intuitiva, a camada no code pode ter ainda comandos mais sofisticados que necessitem de conhecimentos específicos para solução de alguns problemas mais complexos, ainda assim, com vantagens na produtividade.

Essa camada pode ser utilizada por consultores das empresas fornecedoras, consultores de empresas terceiras contratadas para implementação do sistema, técnicos administradores do sistema no cliente e até mesmo pelos próprios usuários, dependendo da gradação dos conhecimentos necessários.

A tendência é que haja uma transferência de funcionalidades para que os próprios usuários, sem conhecimentos especializados, realizem as personalizações do sistema, adaptando-o às suas características e preferências individuais, melhorando suas usabilidades e a experiências. Em outras palavras, a partir de comandos intuitivos, aprendidos a partir de visitas guiadas ou com treinamentos muito rápidos, os usuários alteram suas telas, deixando-as do jeito que desejam. Ainda assim, podem existir personalizações que são mais bem realizadas por consultores ou usuários “avançados” treinados para a tarefa.

Tudo subordinado a uma política geral da empresa. Por exemplo, se um dado deve ser inserido pelos usuários em geral, definido em uma norma organizacional, nenhum usuário pode abdicar do preenchimento obrigatório e transformar esse dado em opcional. Por outro lado, se um dado é específico de uma área e não obrigatório para as demais, um usuário que não utilize esse dado pode fazê-lo sumir de sua tela, melhorando sua experiência com o sistema.

Os usuários também podem alterar a localização dos dados, arrastando os campos para locais mais adequados, bem como separá-los em grupos. Cada usuário tem uma conformação específica da tela que utiliza.

Existem outras modificações que podem ser feitas nessa camada, que antes envolvia analistas e programadores e que agora são possíveis com muita facilidade, seja por meio dos próprios usuários, seja por meio de consultorias especializadas.

A desnecessidade de analistas e programadores deixam as implantações de sistemas mais rápidas, pois as personalizações podem ser feitas in loco pelas equipes responsáveis por elas e pelo próprio usuário. Há uma descentralização das personalizações.

A camada no code permite inserção de novos campos de dados, eliminação daqueles desnecessários, alteração na legenda deles (inclusive para diversos idiomas), mudanças em suas obrigatoriedades, modificação da ordem deles em telas de cadastro, com eventual criação de novos grupos que os separem e espertezas ligadas ao tipo de dado que é inserido.

Os analistas e programadores se deparam com um problema bastante sério e paradoxal que é: desenhar telas que sejam intuitivas, práticas, com poucos cliques, com diversos dados, que se adequem à forma que cada usuário trabalha. Muitas vezes, uma mesma tela atende a diversas áreas da organização, mas a necessidade de dados é diferenciada, porém os analistas precisam disponibilizar todos os dados, ainda que alguns deixem de utilizá-los e isso transforma um sistema de gestão em uma peça complexa e de difícil utilização. Além de diferenças mais grotescas, há diferenças sutis de utilização que diminuem a produtividade, caso não estejam como o usuário realmente utiliza ou deseja. Essa camada, além de resolver problemas de personalização da organização, enfoca na usabilidade pelos diversos agentes humanos.

Customizações por Meio de Analistas e Programadores - A Inevitabilidade de Alterações Complexas

Estratégias e modelos de negócio fazem parte da vida de quaisquer organizações e isso equivale a afirmar que suas formas de gestão são diferenciadas, pois ainda que as estratégias e modelos de negócio sejam semelhantes entre empresas diferentes, principalmente quando atuam no mesmo segmento, as soluções encontradas pelos gestores para solução dos problemas do dia a dia, seus modelos mentais, podem apresentar diferenças marcantes, refletindo-se nos diversos departamentos e consequentemente em seus sistemas de gestão.

Apesar (ainda bem que elas existem) das camadas já apresentadas até aqui (parametrização e no code), representando o esforço dos fornecedores em apresentar sistemas de gestão de mercado flexíveis e que possam ser implementados em tempo aceitável e com custos razoáveis na maioria dos casos, dado o exposto no parágrafo anterior, há a necessidade do desenvolvimento de rotinas complexas utilizando-se analistas, programadores, cientistas de dados e outros.

A pretensão de universalidade dos sistemas de gestão de mercado esbarra, justamente, nos diferenciais que as empresas têm em suas formas de administração, exigindo uma terceira camada, que é a solução do problema por meio de codificação explícita, com analistas e programadores ou com a utilização de outras técnicas, como por exemplo a IA.

O processo de customização utilizando analistas, programadores, cientistas de dados, analistas de requisitos e outros, independentemente da técnica utilizada, sempre envolve maior custo e mais tempo para atingir os resultados desejados. Aqui não se objetiva detalhar essa questão.

O que é necessário destacar é que as organizações precisam estar atentadas e verificar em detalhes, como seus fornecedores garantem essas customizações em versões futuras e se haverá ou não custo. Como já citado, os sistemas têm progressos constantes, com alterações diversas, bem como, alterações específicas para diversas organizações, assim, um fornecedor precisa explicitar como faz a manutenção e garantir em contrato que a organização poderá atualizar suas versões, usufruindo de melhorias, sem perder suas personalizações independentemente da camada em que foram realizadas.

Para essa terceira camada, há uma infinidade de técnicas que permitem personalizações complexas, mais dispendiosas e demoradas, como por exemplo a IA, que mesmo assim poderá requerer códigos explícitos que liguem o sistema ao ferramental de aprendizado de máquina, bem como, o tratamento adequado dos dados utilizados para aprendizagem.

Conclusão

Diante desafio que representa a escolha de um sistema de gestão para suas organizações, os gestores precisam incluir ou dar muita atenção para a dimensão tecnológica, sem quaisquer prejuízos das demais dimensões. Os processos de seleção têm progredido, envolvendo diversas dimensões, mas ainda assim, esse aspecto tem sido relegado a um segundo plano. Por tudo que foi explicitado, entende-se que esta dimensão é uma das principais a serem consideradas em quaisquer processos de seleção.

A dimensão tecnológica, entendendo-se como o conjunto de técnicas empregadas que estruturam um sistema de gestão, deverá ser fortemente considerada nos processos de avaliação. É a partir desse conjunto de técnicas que um sistema de gestão adquire a flexibilidade necessária para resolver os problemas do dia a dia das organizações, atendendo às suas peculiaridades e estruturas diferenciadas.

O nível de automatização de uma organização pode ser baixo, médio ou alto e está ligado à qualidade do sistema de gestão selecionado, envolvendo, de maneira especial, a dimensão tecnológica, que deve ter necessariamente às três camadas apresentadas: parametrização, no code e personalizações com técnicas diferenciadas utilizando-se analistas e programadores, com o apoio da IA e integrações com outros sistemas.

Para conferir este artigo completo do Diretor-Presidente da Fácil, Carlos José Pereira, acesse:  oanalistadeblumenau.com.br

 

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[1] DOMINGOS, Pedro. O algoritmo mestre; tradução: Aldir José Coelho Corrêa da Silva. São Paulo: Novatec, 2017, p 57-58.

[2] LUHMANN, Niklas. Introdução à teoria dos sistemas; tradução: Ana Cristina Arantes Nasser. 3 ed. Petrópolis: Vozes, 2011, p. 108-109.

[3] Ver outros artigos desse blog sobre Inteligência Artificial Generativa.

[4] FIOLHAIS, Carlos. Universo, computadores e tudo o resto; Lisboa: Gradativa, 1994, p. 82.

[5] PINKER, Steven. Do que é feito o pensamento: a língua como janela para natureza humana; tradução: Fernanda Ravagnani. São Paulo: Companhia das Letras, 2008, p. 300.

[6] GREGERSEN, Erick. Ada Lovelace: The First Computer Programmer. Disponível em: <www.britannica.com/story >. Acesso em: dez. 2023.

[7] Os biólogos Maturana e Varela criaram o termo acoplamento estrutural para designar as perturbações mútuas que existem entre o sistema e o entorno, tendo como resultado o desencadeamento de mudanças nos estados de suas estruturas. O termo não designa que um sistema atue diretamente na estrutura de outro, mas que “[…] meio e unidade atuarão como fontes de perturbações mútuas e desencadearão mutuamente mudanças de estado.” (MATURANA, Humberto R.; VARELA, Francisco J. A árvore do conhecimento; tradução: Humberto Mariotti e Lia Diskin; ilustração: Carolina Vial, Eduardo Osorio, Francisco Olivares e Marcelo Maturana Montañez. São Paulo: Palas Athena, 2001, p. 112).

Luhmann passou a utilizar também esse termo durante seus estudos e modificação da Teoria dos Sistemas abandonando o conceito clássico de sistema, teoria essa aplicada em detalhes e com as devidas adequações à Teoria Geral dos Sistemas Sociais. Em seus escritos sobre os sistemas sociais, encontram-se afirmações ligadas à Teoria dos sistemas, comuns para quaisquer sistemas e afirmações que são exclusivas dos sistemas sociais, o que exige do leitor certos cuidados. Anteriormente, Luhmann utilizava somente o termo “interpenetração” (Criado por Parsons), que designa que um sistema coloca toda a sua complexidade à disposição de outro, para que o outro se construa. (LUHMANN, Niklas. Sistemas sociales: Lineamientos para una teoría general; tradução: Silvia Papper; Brunhilde Erker; coordenação: Javier Torres Nafarrete. Santafé de Bogotá: CEJA, 1998, p. 205).

[8] LUHMANN, Niklas. Sociedad y sistema: la ambición de la teoría; tradução: Santiago López Petit; Dorothee Schmitz. 1 ed. Barcelona: Espasa, 1990, p. 89.

[9] Existem milhares de linguagens que foram desenvolvidas. Algumas para propósitos gerais e outras para casos específicos. Poucas linguagens são realmente novas, pois derivam-se de outras. Pode-se citar algumas como Cobol, C#, C++, Algol, Fortran, Pearl, Rebol e Turbo Pascal.

[10] Palestra intitulada Explorando modelos generativos: Uma introdução ao ChatGPT e Midjourney para criação de textos e imagens, proferida por Mateus Cassaniga na Fácil Summit Week 2023, Blumenau, 04 abr. 2023.

Imagem: Freepik.com


Publicado em: 06/02/2024